A TI na movimentação de mercadorias

Muitas corpora¬ções, especializa¬das em logística ou com uma área de porte, já saíram do controle feito em prancheta ou Excel ao investirem em sistemas de ERP ou de controle específico. Enquanto um bom contingente ainda está nessa “arrumação da casa”, se fala na metade das empresas, os outros 50% estão em um chamado estágio 2 – quem já finalizou a informatização da infraestrutura – e partem para soluções que trazem maior controle de tráfego de mercadoria, como captura móvel de informações e uso de Wi-Fi, por exemplo, buscando obter maior performance, mais controle do processo e menor custo.

No entanto, os executivos dos fornecedores de solução admitem que ainda falta uma boa estrada para que o setor possa ser considerado maduro como um todo na utilização de TI, principalmente se comparado com o que acontece no exterior. “Lá fora existem mais empresas especializadas em tecnologia e as soluções são mais baratas, o que torna a tecnologia mais acessível. A própria infraestrutura de telecomunicações tem maior consolidação e mais anos de janela”, garante Wagner Bernardes, diretor de marketing e vendas da Seal, que possui produtos para mobilidade e captura de dados.

No geral, como avalia Hilton Rocha, consultor de negócios e processos em supply chain da Infor – empresa global que trabalha em mais de 100 países e 70 mil clientes com especialização em soluções para a gestão de cadeias logísticas –, os investimentos totais do setor em TI no Brasil ainda são baixos. “Vem crescendo, mas ainda não atingiu um bom nível. As corporações que adquirem serviços logísticos, por exemplo, ainda se preocupam com o menor custo final e não com o valor agregado, e isto se reflete nos investimentos em automatização. Entre um servidor e uma empilhadeira, se investe no segundo. E TI ainda não é explorado da forma como deveria, até porque logística é vista como despesa em muitas empresas”, garante o executivo.

Uma saída é mostrar que as soluções de TI não fazem parte do custo e sim do investimento com retorno de médio ou mesmo longo prazo, e muitas vezes com avanços tangíveis e outros intangíveis. “Essa percepção está mudando, a crise ajudou nesse sentido. No entanto, para rever custos globais é preciso algo mais complexo, como rever a malha de distribuição como um todo”, explica João Mário Lourenço Filho, sócio diretor em supply chain management da IBM.

É interessante notar que estudos como o do Aberdeen Group apontam que os custos logísticos representam entre 5% a 10% do faturamento das empresas e a ineficiência nestas atividades podem implicar valores ainda maiores. Apenas a conta frete é responsável por cerca de 50% destes custos e por isso demanda das empresas uma especial atenção à gestão e aos indicadores. Apenas com o uso de automatização é possível reduzir essa conta em algo entre 8% e 12%.

O fator transporte

Para entender a estratégia utilizada por empresas que alcançaram sucesso na gestão dos gastos logísticos no Brasil, a Webb – provedor com forte atuação no setor – consolidou a opinião de 85 executivos de empresas de grande e médio porte de diversos segmentos. Ao longo do último ano, metade das empresas pesquisadas constatou aumento nos custos de transporte. Em resposta, as principais estratégias adotadas foram o aperfeiçoamento da análise dos gastos, seguido pela melhoria dos processos de contratação e execução da operação de transporte, citados respectivamente por 52%, 46% e 42% dos participantes.

Por outro lado, uma outra parcela das empresas pesquisadas (30%) se destacou por ter reduzido mais de 5% na proporção dos gastos com transportes sobre o faturamento em relação ao ano anterior. Tal redução deve-se à implantação de processos e ferramentas mais eficazes para análise de gastos, seleção, contratação e pagamento de serviços de transportes (veja mais no BOX: Para atingir o Nirvana).

Para se fazer uma comparação com o que acontece no mundo, outra pesquisa global da IBM, feita junto a 400 executivos de 29 verticais – excetuando a América Latina –identificou quatro desafios no setor: a visibilidade das informações da cadeia de suprimentos (70%), o gerenciamento de riscos (60%), o aumento das demandas dos clientes (56%) e os custos do setor (55%). Portanto com questões bem mais amplas que o identificado localmente.

De acordo com Lourenço Filho, da IBM, no entanto, as empresas com a infraestrutura logística evoluída, mesmo no Brasil, também teriam as mesmas preocupações. “Encontramos respostas para os quatro temas a partir do que chamamos de 3 “is” (interconectado, instrumentado e inteligente). Isso pode ser traduzido, no futuro, por termos todas as transações automatizadas, com uma alta interconexão entre os participantes da cadeia, assim como deve existir colaboração e ferramentas que tragam inteligência ao processo, permitindo simulações e predições de cenários”, explica.

Abrindo a carteira

Na fotografia do mercado, os grandes provedores logísticos já atingiram um bom patamar de utilização da TI ao contrário dos pequenos e médios prestadores de serviço. Isso se deve à demanda dos clientes de porte, fazendo com que os provedores de serviço precisem ter melhores práticas de controle, infraestrutura bem montada, sistemas confiáveis e grande visibilidade. Já as corporações que possuem áreas logísticas têm não apenas a questão do porte como definidor de investimentos como também a vertical em que atuam e mesmo o custo/benefício dos projetos. “De modo geral, empresas de bens de consumo e varejo são os que mais investem. Muitos mercados se espelham neles, por terem mais giro. Por outro lado, os mais adormecidos são os de commodities”, aponta Gustavo Figueiredo, diretor de logística da Webb.

Nos últimos anos, como falamos, o investimento é crescente, mas a crise econômica bateu firme na dicotomia TI-logística. Muitos projetos foram engavetados e se a redução do dólar poderia servir como uma alavanca para baratear as soluções e equipamentos, também reduziu o lucro de setores de exportação, que movimentam uma boa parcela do tráfego de produtos.

A maior demanda do setor passa pela melhoria da infraestrutura, algumas vezes até em equipamentos básicos, evolui em alguns casos para a melhoria dos processos com maior automatização e ainda chegando à inteligência operacional. “Temos uma procura por redesenho da cadeia e em planejamento tático e operacional, desde malha viária até o uso de múltiplos modais (formas de transporte de cargas)”, garante Rocha, da Infor. Outras tecnologias emergentes já chegam a uma curva de aceitação importante como o uso de coletores de dados com uso de voz, RFID (identificação por radiofreqüência), uso de Wi-Fi (rede local sem fio) e rastreamento de veículos e cargas.

A visibilidade da cadeia também é um fator que preocupa localmente. “Ainda estamos na infância na questão de enxergar a cadeia como um todo. Precisamos avançar em sistemas de ECR (Efficient Consumer Response), por exemplo”, admite Mario Mohry, diretor de supply chain da Pepsico, que participou de evento da IBM sobre o tema. Como a companhia trabalha diretamente, entregando o produto nas cadeias de lojas para o consumidor final, as respostas podem e devem ser mais dinâmicas. “Vamos testar novas formas de venda para aveia e precisamos avaliar o feedback da nossa estratégia, algo que sem o ferramental apropriado seria impossível”, completa.

Investir é preciso

Fundada há mais de 50 anos nos Estados Unidos, a Martin-Brower opera no Brasil desde 1982 na distribuição para os mercados de food service e bebidas atendendo diversos hotéis e hospitais, assegurando o alto nível de qualidade e segurança alimentar. Atuante com uma cadeia ampla de clientes e fornecedores, a companhia investiu em processos logísticos e em dois sistemas, o Route Control System (RCS) e o Quality Management System (QMS), com o objetivo de aprimorar o controle da sua cadeia de valor. O primeiro atua como controle das atividades de frota

e o QMS é um sistema de

qualidade voltado para o gerenciamento de armazéns.

“A empresa sempre primou pela excelência em sua distribuição. Agora com essas inovações vamos ter um controle remoto online de toda a operação e de tudo o que está acontecendo com os caminhões em qualquer parte do País. Sem contar que o controle dos produtos nos armazéns será aprimorado, trazendo melhora substancial na velocidade de resposta aos clientes, otimização do nível de serviço e redução de custos”, garante Ives Uliana, diretor de operações e supply chain da Martin-Brower. Com os novos sistemas será possível conseguir mais velocidade de resposta e redução de custos, pela melhoria na agilidade dos processos.

O RCS controla toda a telemetria dos veículos, com dados da quilometragem, consumo de combustível, paradas e velocidade, entre outras amostragens, e é composto de um computador de bordo e um handheld carregado pelo motorista. As informações são capturadas automaticamente pelo computador de bordo e outras inseridas no handheld pelo motorista e com a utilização da tecnologia bluetooth e são transmitidas via rede sem fio, o que agiliza a obtenção e o processamento dos dados. Informações que geram relatórios de desempenho do veículo, dados gerais da viagem e das entregas e até da forma de dirigir do condutor. Além disso, há o monitoramento via satélite dos veículos, que podem ser acompanhados em tempo real por qualquer computador que tenha acesso à internet.

Já o QMS tem foco na qualidade dos produtos e serviços. E com ele a Martin aperfeiçoará a operação de seus cinco armazéns, com detalhes e controle dos lotes de produtos, desde a sua chegada até o carregamento e despacho aos clientes. “Isso é feito através de etiquetas e leitores de códigos de barras, dentro do JDE, nosso ERP”, explica o executivo. E torna possível a visualização da atuação da empresa como um todo, permitindo uma melhor integração entre compras, armazém e vendas. Profissionais das áreas de TI e de operações da empresa estiveram envolvidos por meses no processo de aperfeiçoamento e atualização dos sistemas.

Saindo do papel

Outra empresa que faz investimentos pesados na área logística é a Suzano Papel e Celulose, que pretende automatizar todos os seus terminais marítimos e já fez importantes movimentos na área. Afinal, com a entrada em operação da Linha 2 da Unidade Mucuri, no extremo sul da Bahia, a companhia – maior exportadora de containers do tipo dry do País – praticamente triplicou sua capacidade de produção. Atualmente, o objetivo é a referência mundial em inovação e tecnologia logística. Uma forma de garantir competitividade no ambiente global.

A Suzano iniciou a implementação do projeto de automação dos terminais marítimos no exterior com o objetivo de integrar as áreas de negócios da empresa aos operadores logísticos. Desenvolvido em conjunto entre as áreas de logística, comercial e TI, o projeto tem como foco a visibilidade de todo o processo, bem como a integridade das informações.

Fruto da parceria com a Sisplan, o projeto possibilitou também automatizar processos que eram feitos manualmente pelos escritórios de vendas internacionais nos Estados Unidos e Europa, além de rastrear a mercadoria desde a sua fabricação até a entrega ao cliente final em qualquer parte do mundo. Em fase de implementação na Europa (em oito terminais), o projeto levou dois meses para ser concluído nos Estados Unidos (seis terminais), onde opera desde agosto do ano passado.

Gestão é a palavra

Utilizando a TI como motor das mudanças, tanto na gestão como operação, a empresa tem como meta desenvolver projetos de monitoramento de containers, automação de terminais, gerenciamento de abastecimento de madeira, insumos e escoamento de produtos acabado, entre outras iniciativas. Nos últimos dois anos, a Suzano implementou sistemas de gestão por indicadores para custos logísticos, performance e serviços, desenvolveu um projeto de benchmarking, padronizou com sucesso os procedimentos e sistemas operacionais nas unidades de Embu e Limeira, ambas em São Paulo. Outra iniciativa foi a criação da área de Inteligência Logística, que desenvolveu serviços sobre medida para seus clientes e adotou a metodologia 6 Sigma para direcionar os esforços da área para a maior produtividade com qualidade.

O tráfego de caminhões utilizados pela empresa chega a mil viagens por dia entre expedição e entrada de insumos. E para controlar essa frota, a Suzano implantou o Cecol – Centro de Controle de Operações Logísticas, um sistema integrado de gerenciamento de abastecimento de madeira (Cecom), insumos (Cecoi) e escoamento de produtos acabados (Cecop). O projeto inovador, que otimizará e dará suporte à logística na Unidade Mucuri, utiliza os mais avançados recursos de tecnologia da informação e permitirá redução de custos da ordem de R$ 1,2 milhão ao ano. O sistema controla o abastecimento de madeira desde o carregamento até a fábrica, rastreando os caminhões com sistema GPS.

Outro investimento em destaque é o monitoramento do transporte de containers, desenvolvido em parceria com a GT Nexus e a Multicom.net. Com a nova ferramenta é possível visualizar a posição de seus navios nos oceanos do mundo todo e emitir alertas sobre atrasos ou mudanças nos prazos de entrega, o que traz melhorias no atendimento aos clientes internacionais, podendo posicioná-los com antecedência e precisão sobre o prazo de entrega da carga.

A oferta agora

Como vimos, existe uma grande diversidade de como os fornecedores estão trabalhando os novos projetos do setor. A Seal, por exemplo, acredita no corpo-a-corpo, com eventos e palestras para falar sobre os ganhos da tecnologia e disseminar o uso de seus equipamentos. “Em março teremos o nosso webinar, mostrando a experiência dos clientes, o que gera uma identificação de quem deseja investir. Acredito em uma demanda por soluções que saiam das quatro paredes, como mobilidade”, garante Bernardes.

Já a Infor se adequa à demanda do Brasil. “Em termos de tendências, acho que estamos até alinhados com o mundo, mas pelo gap de investimentos temos mais possibilidades de crescimento por aqui”, assegura Rocha. Falando em soluções, a empresa possui desde sistemas para o planejamento estratégico, indicando o tático e operacional, englobando todo o supply chain, até a venda de seu ERP integrado a ferramentas de SOA, além de outros sistemas de gestão, com foco no tema logístico.

Porém, existem os otimistas. “Queremos dobrar de tamanho nestas soluções este ano. O limite para os provedores de tecnologia será a capacidade de conseguir entregar e customizar os sistemas para os clientes”, explica Figueiredo, da Webb. O foco para conseguir estes resultados será no ciclo das empresas, com soluções que evoluem do pedido, passando pela integração aos sistemas de ERP, até a rastreabilidade e controle das cargas. (C.F.)

PARA ATINGIR O NIRVANA

Veja a seguir os Dez Mandamentos para atingir a redução do custo de transporte (*) e aumentar a eficiência da cadeia produtiva.

1- Rede flexível: as decisões da cadeia de suprimentos e de produção influem na economia do transporte. Uma compreensão completa da rede faz avaliar e redesenhar as cadeias de suprimento de tal modo que fornecedores, produtores, distribuidores e varejistas estejam alinhados às condições vantajosas de frete que reduzem custos e aprimoram o serviço.

2- Fixe orçamentos e meça o progresso: o velho ditado já diz que não se pode administrar o que não se pode medir. Entenda seu orçamento de transporte e compare-o cautelosamente com os padrões do mercado. Controle desde linhas de produtos, taxas, serviços e modos, incluindo indicadores-chave de performance. Uma administração abrangente e cuidadosa garante maior visibilidade na rede, conforme mudanças vão ocorrendo.

3- Melhore as estratégias do processo: utilize as redes de transporte para intensificar o cross-docking e evitar postergações, reduzindo os tempos de entrega e melhorando o capital de giro.

4- Negocie limitações de preço e capacidades a longo

termo: equilibre o preço com a capacidade de

expansão do distribuidor, conforme se dê o crescimento

de seus negócios.

5- Otimize o cumprimento de entrega: assegure-se de que suas despesas com frete estão adequadas. Exija o cumprimento das guias de rotas para evitar despesas não orçadas com fretes.

6- Melhore o planejamento de transporte: se pagou pelo espaço, então use-o. Conhecer de perto os pontos de carga e descarga, o tamanho e a natureza da mercadoria a ser transportada torna o uso de cada metro cúbico de espaço mais eficiente.

7- Aprimore a consolidação de saída: certifique-se de inserir o maior volume de carga possível em cada container e verifique que todos os fretes e modos sejam otimizados.

8- Amplie a visão: desde a entrada do pedido até a entrega final, inteire-se do que se passa em todo o processo e antecipe as ações a serem realizadas.

9- Melhore os processos de execução: apenas pague pelo que acordou em contrato. Audite constantemente os carregamentos de forma a certificar-se de que todos os termos previamente consentidos estão sendo cumpridos.

10- Integração: enxergue os processos de transporte e comércio como algo integrado, a fim de compreender o quanto um impacta no outro.

(*) Fonte: Infor

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